O jovem sentando no banco de
madeira velha não sabia como aquilo aconteceu. Em um piscar de olhos, o mesmo
problema havia se instalado como da primeira vez. Esperava o trem pela manhã,
certo de que quando ele chegasse e suas portas de metal se abrissem, poderia
entrar com a cabeça baixa. Ninguém se senta ao seu lado então ele lê um livro
velho. Deseja desesperadamente viver a história que os personagens contam, pois
julga serem diferentes da que ele mesmo vive. Mas o tema parece tão mínimo. Estica
as pernas, olha para cima e fecha os olhos, ouve o ambiente e as vozes que o
cercam. Mas estão todas tão distantes e sem sentido, nada dizem de verdade.
Deveria ter previsto,
deveria saber que ele o encontraria. O perseguidor
o encontrou pela segunda vez. Ele é sagaz, difícil de enganar. O jovem tentou
desaparecer, se tornar invisível, camuflar-se no ambiente e nas paredes
brancas. Mudou a postura, o tom de voz. Mas não seria um cabelo diferente ou um
sorriso fácil que burlaria seu destino e desviaria aquele que o caçava. Porque ele
conhecia os seus segredos e sabia que a ferida que o jovem carregava na pele
não cicatrizava nunca. Na primeira vez, com uma perversão calma e paciente, ele
tocava nas ataduras e as puxava, expondo o sangue que fluía lentamente. Ele se
contorceu e tentou correr, mas entregou-se a uma verdade suja. As lágrimas
estavam secando quando o jovem levantou-se e, segurando os ferimentos, correu. Mas
ele correu sem forças, correu contra a própria vontade, correu porque foi
puxado. Como uma marionete que anda porque a fazem andar, ele apenas viveu
porque queriam que ele vivesse. Ninguém pergunta ao boneco de madeira o que ele
deseja.
O som dos trilhos vibrantes
começava a se elevar, pessoas estranhas se aproximavam da linha amarela. O perseguidor estava ao seu lado. O jovem
desejava vê-lo longe, mas como da primeira vez, ele suplicava por sua
companhia, porque naquele paradoxo, seu carrasco era a lembrança de que ele
ainda vivia. Ele representava a fina
corda de seda que ligava ao resto do mundo. Como se estivessem sozinhos, ele sentou-se ao lado do homem
solitário. “Não vou deixar você”, disse ele,
“porque não quero e porque você não quer que eu me vá”. O jovem não respondeu,
apenas segurou sua mão e disse “Talvez agora eu consiga ir”, pensou.
Mas para isso ele precisava ser definitivo em suas escolhas, sem se dar o luxo de errar. A única maneira de evitar o eterno prolongamento das coisas era ser interrompido bruscamente, e foi o que ele fez, dando alguns passos e atirando-se na frente da grande serpente de aço, desaparecendo para sempre.
Nos últimos segundos,
percebeu horrorizado, que o perseguidor o abraçava pela cintura, em um
sacrifício gêmeo. “Para sempre”, sussurrou. Mas depois apenas houve o escuro.
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